Cuidado!
Quem tem muitos amigos no “Face” pode ter uma personalidade narcísica.
Personalidade narcísica não é alguém que se ama muito, é alguém muito
carente.
Faço parte do que o jornal britânico The Guardian chama de “social media sceptics” (céticos em relação às mídias sociais) em um artigo dedicado a pesquisas sobre o lado “sombrio” do Facebook (17/3/2012).
Ser um
“social media sceptic” significa não crer nas maravilhas das mídias
sociais. Elas não mudam o mundo. Aliás, nem acredito na “história”, sou
daqueles que suspeitam que a humanidade anda em círculos, somando
avanços técnicos que respondem aos pavores míticos atávicos: morte,
sofrimento, solidão, insegurança, fome, sexo. Fazemos o que podemos
diante da opacidade do mundo e do tempo.
As mídias
sociais potencializam o que no humano é repetitivo, banal e angustiante:
nossa solidão e falta de afeto. Boas qualidades são raras e normalmente
são tão tímidas quanto a exposição pública.
E, como dizia o poeta russo Joseph Brodsky
(1940-96), falsos sentimentos são comuns nos seres humanos, e quando se
tem um número grande deles juntos, a possibilidade de falsos
sentimentos aflorarem cresce exponencialmente.
Em 1979, o historiador americano Christopher Lasch (1932-94) publicava seu best-seller acadêmico “A Cultura do Narcisismo”,
um livro essencial para pensarmos o comportamento no final de século
20. Ali, o autor identificava o traço narcísico de nossa era: carência,
adolescência tardia, incapacidade de assumir a paternidade ou
maternidade, pavor do envelhecimento, enfim, uma alma ridiculamente
infantil num corpo de adulto.
Não estou
aqui a menosprezar os medos humanos. Pelo contrário, o medo é meu irmão
gêmeo. Estou a dizer que a cultura do narcisismo se fez hegemônica
gerando personalidades que buscam o tempo todo ser amadas, reconhecidas,
e que, portanto, são incapazes de ver o “outro”, apenas exigindo do
mundo um amor incondicional.
Segundo a
pesquisa da Universidade de Western Illinois (EUA), discutida pelo
periódico britânico, “um senso de merecimento de respeito, desejo de
manipulação e de tirar vantagens dos outros” marca esses bebês grandes
do mundo contemporâneo, que assumem que seus vômitos são significativos o
bastante para serem postados no “Face”.
A pesquisa
envolveu 294 estudantes da universidade em questão, entre 18 e 65 anos, e
seus hábitos no “Face”. Além do senso de merecimento e desejo de
manipulação mencionados acima, são traços “tóxicos” (como diz o artigo)
da personalidade narcísica com muitos amigos no “Face” a obsessão com a
autoimagem, amizades superficiais, respostas especialmente agressivas a
supostas críticas feitas a ela, vidas guiadas por concepções altamente
subjetivas de mundo, vaidade doentia, senso de superioridade moral e
tendências exibicionistas grandiosas.
Pessoas com tais traços são mais dadas a buscar reconhecimento social do que a reconhecer os outros.
Segundo o
periódico britânico, a assistente social Carol Craig, chefe do Centro
para Confiança e Bem-estar (meu Deus, que nome horroroso…), disse que os
jovens britânicos estão cada vez mais narcisistas e reconhece que há
uma tendência da educação infantil hoje em dia, importada dos EUA para o
Reino Unido (no Brasil, estamos na mesma…), a educar as crianças cada
vez mais para a autoestima.
Cada vez mais plugados e cada vez mais solitários. Na sociedade contemporânea, a solidão é como uma epidemia fora de controle.
O Facebook é
a plataforma ideal para autopromoção delirante e inflação do ego via
aceitação de um número gigantesco de “amigos” irreais. O dr. Viv
Vignoles, catedrático da Universidade de Sussex, no Reino Unido, afirma
que, nos EUA, o narcisismo já era marca da juventude desde os anos 80,
muito antes do “Face”.
Portanto, a
“culpa” não é dele. Ele é apenas uma ferramenta do narcisismo
generalizado. Suspeito muito mais dos educadores que resolveram que a
autoestima é a principal “matéria” da escola.
A educação não deve ser feita para aumentar nossa autoestima, mas para nos ajudar a enfrentar nossa atormentada humanidade.
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